Após liderar a conquista da terra prometida, Josué repartiu a terra das tribos de Israel. E quando todo o povo se reuniu diante da tenda da congregação, armada em Siló, sete tribos ainda não haviam recebido sua herança territorial. Josué, então, indagou: “até quando sereis negligentes para passardes para possuir a terra que o Senhor, Deus de vossos pais, vou deu?” (Js 18.1-3)
Parece-nos que a repreensão de Josué estava escudada na promessa do Senhor Deus que tirara os filhos de Israel do Egito e lhes daria a terra de Canaã e que, após alguns anos da travessia do rio Jordão para entrar na terra prometida, ainda havia muito a conquistar e povos inimigos a vencer e a expulsar. Depois de repartir as terras entre as sete tribos restantes, Josué exortou o povo a observar a lei do Senhor, servindo-o e se despediu.
Ainda que estejamos em outro contexto, utilizamos da indagação de Josué para refletir a respeito do cumprimento da Grande Comissão dada por Jesus a todos os cristãos de todos os tempos e lugares: anunciar o Evangelho e fazer discípulos de todos os povos (Mt 28.18-10, Mc 16.15,16)
Por que não terminamos a missão atribuída? Por que tamanha morosidade? Quando Jesus instituiu a Grande Comissão, prometeu que estaria conosco todos os dias (Mt 18.20). De acordo com as estatísticas de diferentes agências missionárias e outras instituições sérias e comprometidas com o Reino de Deus, dos 8 bilhões de habitantes do planeta Terra, um terço nunca (!!!) ouviu falar do nome de Jesus e da salvação que nele há. (www.lausanne.org)
Há muito o que ser feito. Cada cristão é importante na tarefa atribuída pelo Mestre e ele mesmo é a garantia de que ela será cumprida eficazmente. A missão é dele, por ele e para sua glória. Os cristãos do primeiro século estavam comprometidos com a evangelização dos povos ao ponto de seus opositores afirmarem: “estes que têm alvoroçado o mundo chegaram também aqui” (At 17.6) e mesmo a perseguição não foi capaz de detê-los e, assim, o mundo antigo conheceu a mensagem salvífica.
No entanto, houve um período de estagnação e se chegou a acreditar que a Grande Comissão não era mais uma tarefa que se aplicava aos cristãos. Mas no final do século XVIII, o fundador e senhor da igreja, Jesus Cristo, despertou um jovem pastor inglês que se preocupava com o anúncio do Evangelho aos povos e deixou seu país e partiu para a distante Índia. Era William Carey, o ‘pai das missões modernas’, que alvoraçou aquele país e em seu tratado missionário denominado de “Investigação sobre o dever dos cristãos”, desafiava a todos a “esperar grandes coisas de Deus e realizar grandes coisas para Deus”.
Escrito há dois séculos, o texto é pertinente e atual ao demonstrar a necessidade de comunicar aos povos e de indicar a viabilidade de execução do trabalho missionário. E às objeções levantadas, o autor é arguto ao explicitar os meios que podem ser utilizados para a evangelização. Por exemplo, se a distância parece ser uma barreira, os meios de transporte estão cada vez mais desenvolvidos e permitem acesso aos territórios mais longínquos. Se as características culturais e linguísticas dos povos parecem difíceis, o paciente estudo e imersão permitirão a compreensão e a contextualização necessárias. E diante dos perigos e perseguições que podem sobrevir, deve-se lembrar que a vida do missionário está nas mãos de Deus.
O exemplo de William Carey arrastou muitos outros que deixaram suas comunidades locais para anunciar Jesus a outros povos a respeito da verdadeira salvação. E é salutar mencionar que antes dele, os cristãos morávios (da atual República Checa) foram atuantes porque acreditavam que missões são tarefa da igreja local, de cada cristão e se lançaram a diferentes regiões para evangelizar. Alguns deles chegaram ao ponto de se venderem como escravos para terem a oportunidade de falar de Jesus a outros que não tinham acesso à sua mensagem. Os morávios são um exemplo de dedicação à causa missionária e fizeram (e fazem) tudo para alcançar o maior número possível de pessoas.
Desde o século XIX os esforços de evangelização são animadores. O Movimento de Lausanne – preocupado com o avanço da evangelização mundial – apresenta uma estatística de que entre os séculos I e XIX, o número de cristãos correspondia a 2,5% da população mundial. Ao longo do século XX, o percentual subiu para 11% ou um crente para cada nove não convertidos no mundo (Winter, R. & Koch, B. Completando a tarefa. Perspectivas no Movimento Cristão Mundial. 2009. pp.547-560).
Em 1895, o pastor sul-africano Andrew Murray escreveu o livro, hoje clássico, “A chave para o problema missionário” e nele apresenta uma instigante conjectura. Segundo o autor, se cada cristão interessasse por missões, pela expansão do reino e tivesse uma vida de santidade e um treinamento missionário, “dentro de trinta anos todo homem e mulher no mundo teria tido o evangelho ao seu alcance” (1999, p.23).
Você não leu errado, 30 anos. Ou seja, há quase 130 anos, Andrew Murray acreditava que a tarefa missionária de alcançar todos os povos poderia ser concluída em pouco tempo se todos os cristãos se envolvessem e se comprometessem com a evangelização. E como cristãos do século XXI, podemos olhar o passado e perceber que, naquele tempo, havia inúmeras limitações (geográficas, tecno-científicas, sociais e culturais) que foram ultrapassadas e hoje temos melhores aparatos.
Da conjectura de Murray, é possível inferir que o comprometimento dos cristãos com uma vida em santidade e amor ao Senhor é a ‘chave’ para o avanço da evangelização e, sim, a tarefa missionária pode ser concluída em nosso tempo. Pelas estatísticas do número de cristãos existentes e com os recursos estruturais, tecnológicos e materiais disponíveis podemos perceber a viabilidade do cumprimento da Grande Comissão. E não apenas por esses elementos, principalmente porque a missão é de Deus e em sua onipotência, confere aos seus servos o poder e a intrepidez para o cumprimento da tarefa. Nossa morosidade não é justificável!
Que o Senhor tenha misericórdia de nós!!
Colunista: Sandra Mara Dantas